Elevando a definição de Deep Tech

Uma abordagem transdisciplinar que possibilita às organizações e aos ecossistemas de negócios amplificar seu impacto na economia digital.

Simon Robinson
UX Collective 🇧🇷
7 min readJun 23, 2023

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Blocos coloridos abstratos
Image: Nelia Designs

Com tanto interesse demonstrado pelo setor de tecnologia mundial em Deep Tech, gostaria de apresentar como decidimos elevar o conceito de deep tech e, assim, ajudar pessoas e organizações a terem uma visão mais profunda de nossa abordagem para o design de tecnologia que honra a humanidade e possibilita realmente gerar impacto social e ambiental.

Definições Tradicionais de Deep Tech

O primeiro uso documentado da frase ‘deep tech’ pode ser encontrado em The Practice of Technical and Scientific Communication (1998), Jean A. Lutz e C. Gilbert Storms. O livro inclui uma breve entrevista com Mat Tavares, gerente de operações de serviços técnicos da Ratheon, que usa a frase para se referir a habilidades que requeiram treinamento científico e de engenharia, bem como a capacidade para entender questões complexas.

Em 2014, Swati Chaturvedi forneceu uma definição formal de ‘deep tech’ para definir uma nova categoria de start-up que se baseia em descobertas científicas tangíveis e que têm a capacidade de impactar vários mercados. Em 2019, a TechWorks expandiu essa definição, descrevendo a maneira como as empresas de deep tech “frequentemente possuem inovações de engenharia fundamentais e defensáveis que as distinguem das empresas que se concentram no refinamento incremental ou na entrega de tecnologias padronizadas ou usam apenas a inovação no modelo de negócio para criar oportunidades”.

Em 2017, a Holonomics e a 1STi se uniram para entender como seria possível desenvolver uma nova geração de ecossistemas de inovação que pudessem gerar impacto ao superar as barreiras enfrentadas pelas abordagens tradicionais ao design de tecnologia, plataformas digitais e inteligência artificial. Queríamos nos afastar de frases como ‘tecnologia avançada’ e ‘high tech’, pois não refletiam nossa necessidade de um relacionamento mais profundo e significativo entre as esferas humana, tecnológica e ecológica. Sendo assim, criei a expressão ‘deep tech’ sem ainda saber que ela já existia.

Os três aspectos fundamentais da Deep Tech Elevada

Entretanto, ao pesquisar a expressão e descobrir que não fui o primeiro a criá-la, decidi usá-la em nossa Deep Tech Network elevando o conceito. Comecei por propor os fundamentos desta definição expandida por meio da inclusão de três aspectos fundamentais:

1. Experiência vivida

As empresas normalmente dedicam todos os seus esforços medindo a experiência através do prisma de frameworks quantitativos e qualitativas, porém, raramente alocando tempo para contemplar a natureza da própria experiência. A prática filosófica de explorar a “experiência vivida” é uma maneira poderosa de alcançar isso.

Trabalhar com a experiência vivida em um contexto corporativo ou organizacional é ter a capacidade de explorar a experiência como ela é na realidade, sabendo que nossos ambientes físicos externos, conforme vivenciados por nós em nossos lifeworlds (mundos internos), podem diferir muito de outras pessoas que tiveram uma educação completamente diferente. Ser sensível à nossa experiência vivida significa mudar como projetamos iniciativas de transformação digital e cultural, aplicando frameworks e metodologias multidimensionais mais sutis que vêm da psicologia e de práticas filosóficas como a fenomenologia e a hermenêutica.

2. A Questão do Ser

No final do século XX, as pessoas tinham sentimentos ambivalentes em relação à tecnologia, não sabendo se ela seria uma força para o bem ou para o mal, como, por exemplo, nos avanços da engenharia biológica e no surgimento do estado de vigilância. A questão do que significa ser humano em um mundo tecnológico é agora mais pertinente do que nunca. Enquanto a tecnologia de hoje nos apresenta novas formas de experimentar o mundo por meio de conectividade e interações em massa, a produção em massa levou a uma obsessão pela eficiência, vendo tudo — inclusive as pessoas — como recursos que devem ser otimizados.

Por isso, em nosso livro Customer Experiences with Soul, exploramos essa grande questão do ser em relação ao design, declarando que “a palavra mais disruptiva que se pode usar em inovação é alma”. As soluções Deep Tech como as definimos, honram o que é ser humano em nosso mundo e revelam novas formas de estar no mundo, nos reconectando ao sagrado.

3. Valores Humanos Universais

Os cinco valores humanos universais de paz, verdade, amor, retidão e não-violência podem ser encontrados nas mais antigas escrituras sagradas. Os valores são universais, pois, seu papel é ajudar a humanidade a evoluir e orientar as pessoas para uma melhor experiência de vida. Eles, portanto, são a mais alta expressão de humanidade.

Como explica Maria Moraes Robinson em Customer Experiences with Soul, “quando vivemos nossas vidas sem valores humanos nos desconectamos de tudo. Isso se deve à nossa ignorância, por termos esquecido de quem somos e por que estamos aqui. Como pouco exploramos essas questões mais profundas de quem somos, criamos uma sensação de separação em muitos níveis — entre países, entre colegas de trabalho e pessoas de outros grupos sociais, conosco mesmos e com a natureza”.

Atualmente, nosso uso da tecnologia está exacerbando esse sentimento de separação e está levando a conflitos. Como explica Maria, nossa situação atual é paradoxal — as pessoas têm tanto o desejo de se reconectar quanto há tecnologia disponível para isso, mas ainda temos uma mentalidade de separação. Os valores humanos universais são a essência da conexão e do relacionamento com os outros e, dado que elevam nossa experiência de vida no mundo e também nosso senso de ser, fornecem a base mais fundamental para nossa concepção de deep tech.

Nossa definição de Deep Tech Elevada

Em 2019, percebemos que o trabalho que estávamos fazendo era tão abrangente que precisávamos organizar em um livro os frameworks e metodologias deep tech que estávamos criando. Publicamos Deep Tech and the Amplified Organization em 2021, com a seguinte nova definição de Deep Tech:

Deep tech é o desenvolvimento de tecnologias avançadas construídas a partir de uma base de valores humanos e por ecossistemas conscientes.

Para ajudar as pessoas a entender o que essa definição realmente significa na prática e ajudar as organizações a começarem a projetar e implementar soluções deep tech com base em nossa abordagem, criamos o Manifesto Deep Tech com os seguintes sete princípios básicos:

O manifesto Deep Tech

  1. O objetivo da Deep Tech é usar o deep thinking para encontrar soluções profundas para problemas complexos;
  2. Deep Tech combina pensamento analítico e consciência artística;
  3. A Deep Tech cria inteligência aumentada — a combinação de inteligência artificial com ações humano consciente;
  4. Privacidade e ética são elementos centrais dos algoritmos Deep Tech;
  5. Deep Tech é desenvolvido por pessoas talentosas que vêm de uma rica diversidade de origens;
  6. Os valores da Deep Tech são os cinco valores humanos universais de paz, verdade, amor, retidão e não-violência;
  7. A Deep Tech nos ajuda a explorar nosso mundo e a nós mesmos de maneiras cada vez mais significativas, honrando o que é ser humano em nosso mundo.

O manifesto aponta as pessoas e a organização para um novo relacionamento com a tecnologia que não se baseia apenas na obtenção de resultados significativos e impactantes, mas também descreve a profundidade do pensamento e as dimensões filosóficas da experiência vivida, a consciência artística, a IA ética, os valores humanos universais e a questão do ser, do sentido e da humanidade.

Blueprint da organização amplificada

O aspecto final que é necessário levar em consideração para apreciar plenamente nossa elevada definição de deep tech é a necessidade de visão sistêmica. Com isso, quero dizer que nossa definição está enquadrada no contexto de nosso conceito de organização ampliada. A tecnologia comes into being (“se manifesta”) nas organizações e, portanto, a tecnologia só pode ser profunda se primeiro a organização for verdadeira em seus valores, autenticidade e alma.

Definimos “organizações amplificadas” como negócios regenerativos intencionais que são propositais, engajados e hiperconectados. Quando direcionadas por valores humanos universais, as organizações podem se abrir para as maneiras pelas quais a deep tech pode ajudar a amplificar seu impacto nos ecossistemas, na sociedade e em nosso planeta.

Blueprint da organização amplificada
The Amplified Organisation Blueprint, from Deep Tech and the Amplified Organisation, © Robinson, Couto and Moraes Robinson (2021)

Ao integrar estratégia, design, plataformas, pessoas, propostas de valor, inteligência artificial e valores humanos, nosso blueprint amplificado fornece um caminho sistêmico claro para o design e desenvolvimento de novas estratégias digitais de uma maneira que engaja os clientes e que podem ser implementadas de forma ágil em organizações e ecossistemas inteiros, genuinamente orientados por um propósito.

Portanto, se retornarmos à nossa definição de tecnologia profunda como “o desenvolvimento de tecnologias avançadas construídas a partir de uma base de valores humanos por ecossistemas conscientes”, podemos agora apreciar plenamente o quão profunda é essa definição. Ela muda o foco da própria tecnologia para uma maneira mais profunda de pensar sobre os impactos sistêmicos dessa tecnologia, em oposição apenas à solução superficial para a qual a tecnologia supostamente é uma resposta. Nossa definição abrange a mais alta concepção de humanidade, a inclusão da qualidade das relações nos ecossistemas que desenvolvem a tecnologia e a exigência de autenticidade genuína dessas pessoas e organizações, projetando, implementando e controlando a tecnologia avançada que agora permeia todos os aspectos de nossas vidas.

Referências

  • Chatyrvedi, S. (2015) So What Exactly is ‘Deep Technology’​?, LinkedIn
  • Luz, J.A. e Storms, C.G. (1998) The Practice of Technical and Scientific Communication: Writing in Professional Contexts (ATTW Contemporary Studies in Technical Communication, vol 4), Praeger
  • Robinson, S. e Moraes Robinson, M. (2017) Customer Experiences with Soul: A New Era in Design, Holonomics Publishing
  • Robinson, S., Couto, I. e Moraes Robinson, M. (2023) Deep Tech e a organização amplificada: como elevar, escalar e amplificar seus negócios por meio dos novos 4ps de plataformas, propósito, pessoas e planeta, Alta Books
  • Techworks, What is Deep Tech?, Retrieved 23/06/23

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Co-author of Deep Tech and the Amplified Organisation, Customer Experiences with Soul and Holonomics: Business Where People and Planet Matter. CEO of Holonomics